Usar bancos ligados ao crime organizado é crime? Especialista analisa
A Receita Federal localizou fintechs que seriam usadas pelo Primeiro Comando da Capital (PCC) para lavagem de dinheiro. O caso aconteceu durante a Operação Carbono Oculto, deflagrada pelo órgão nesta quinta-feira (28), que cumpriu mandados de busca e apreensão e de prisão na Avenida Faria Lima, centro financeiro da cidade de São Paulo. Segundo a denúncia, uma das brechas utilizadas pelas organizações criminosas é a não obrigatoriedade de prestação de informações à Receita Federal sobre as operações financeiras dos clientes por meio da e-Financeira. Ao todo, os valores movimentados ultrapassam a marca de 30 bilhões de reais.
Para entender se o uso de instituições ligadas ao crime organizado pode gerar punições para os usuários, o TechTudo entrevistou a Diretora de Relações Institucionais e Regulatory Affairs da Associação PAGOS de Gestão de Pagamentos Eletrônicos, Dr.ᵃ Ruth Quevedo. O Banco Central do Brasil também foi procurado, mas não retornou a tentativa de contato até o fechamento desta matéria. Confira a seguir, mais detalhes sobre o caso e como se proteger.
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Usar bancos ligados ao crime organizado é crime? Especialista analisa
Mariana Saguias/TechTudo
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Usar bancos ligados a facções é crime? Entenda o que diz a lei
A legislação federal brasileira não contém um texto único que defina as fintechs, mas ela estabelece um conjunto de normas que as regulam, com destaque para a Lei do Sistema de Pagamentos Brasileiro (Lei 12.865/2013) e a Lei de Proteção de Dados (LGPD, Lei 13.709/2018). No último dia 28 de agosto, a Receita Federal publicou uma instrução normativa que iguala as fintechs a bancos no tratamento tributário, buscando combater crimes contra a ordem tributária. A autorização para o seu funcionamento depende do Banco Central do Brasil, que estabelece as regras, principalmente para as instituições de pagamento.
A Instrução Normativa RFB Nº 2.278, de 28 de agosto de 2025, destaca o seguinte em seu segundo artigo:
Art 2º”As instituições de pagamento e os participantes de arranjos de pagamentos sujeitam-se às mesmas normas e obrigações acessórias aplicáveis às instituições financeiras integrantes do Sistema Financeiro Nacional – SFN e do Sistema de Pagamentos Brasileiro – SPB relativas à apresentação da e-Financeira, instituída pela instrução Normativa RFB nº 1.571, de 2 de julho de 2015.””
Em entrevista ao TechTudo, a Dr.ᵃ Ruth Quevedo, Regulatory Affairs e Diretora de Relações Institucionais da Associação PAGOS de Gestão de Pagamentos Eletrônicos, destaca que a Lei nº 9.613/1998 (Lei de Lavagem de Dinheiro), alterada pela Lei nº 12.683/2012, estabelece penas de reclusão e multa para quem ocultar ou dissimular a origem de recursos ilícitos. Além disso, o Código Penal e a Lei nº 8.137/1990 tipificam crimes contra a ordem tributária, sonegação fiscal, falsidade ideológica e fraude.
O foco da punição está na conduta ilícita do usuário, e não no canal utilizado. A lei também responsabiliza instituições que deixarem de cumprir suas obrigações de prevenção à lavagem de dinheiro, incluindo o dever de monitorar e reportar operações suspeitas ao COAF (Conselho de Controle de Atividades Financeiras). Portanto, os usuários que tentam se beneficiar de bancos digitais para fins ilícitos já estão sujeitos às mesmas punições aplicáveis em todo o sistema financeiro.
Como os bancos digitais conseguem funcionar?
A regulação de bancos digitais e instituições de pagamento é de competência do Banco Central do Brasil, que estabelece requisitos de capital, governança, segurança tecnológica e controles internos. Um eixo central dessa regulação é a Prevenção à Lavagem de Dinheiro e ao Financiamento do Terrorismo (PLD/CFT). Nesse ponto, a Lei nº 9.613/1998 e a Lei nº 12.683/2012 determinam que todas as instituições financeiras e de pagamento devem adotar mecanismos de controle, realizar políticas de “conheça seu cliente” (KYC), monitorar transações atípicas e comunicar operações suspeitas ao COAF.
O Banco Central, por sua vez, regulamenta esses deveres em normas como a Resolução BCB nº 119/2021, que detalha as obrigações de fintechs, bancos digitais e demais instituições autorizadas. Ainda assim, como ocorre em qualquer canal financeiro, seja em bancos tradicionais, instituições digitais ou até mesmo no uso de dinheiro em espécie, algumas organizações criminosas podem tentar utilizar brechas para movimentar recursos ilícitos. Esse é um desafio global, inclusive apontado em relatórios do GAFI/FATF, órgão internacional que estabelece recomendações de combate à lavagem de dinheiro.
No Brasil, o enfrentamento ocorre integradamente entre Banco Central, Receita Federal, COAF e autoridades policiais, com participação ativa das instituições reguladas. As fintechs, por exemplo, já estão inseridas nesse regime com papel relevante na comunicação de operações suspeitas, reforçando a transparência e a rastreabilidade no sistema de pagamentos.
Com informações de Banco Central do Brasil, O Globo, Receita Federal e Diário Oficial da União
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