Celular à noite faz mal? Descubra quando parar de usar antes de dormir


O hábito de usar celular antes de dormir já faz parte da rotina de diversas pessoas pelo mundo. Os aplicativos de redes sociais, mensagens, vídeos e até mesmo de relaxamento, ocupam, muitas vezesm grande parte das últimas horas do dia. Essa rotina substitui rituais tradicionais e mais saudáveis de preparo para o sono, como a leitura de um livro ou uma conversa fora das telas. A prática tem despertado preocupações entre especialistas, que apontam para os riscos à saúde física e mental associados ao uso excessivo de telas no período noturno.
Estudos científicos mostram que a exposição à luz emitida pelos smartphones pode atrasar o início do sono, reduzir sua qualidade e até gerar impactos no humor e na memória. Mas a discussão não para por aí: pesquisadores também indicam que não é apenas a chamada “luz azul” a única responsável pelos problemas. O tipo de conteúdo consumido e a falta de higiene do sono têm papel, por vezes, até mais relevante.
Para entender os impactos do uso frequente do celular antes de dormir, o TechTudo consultou especialistas, analisou dados de pesquisas e ouviu relatos de usuários para saber como esses hábitos realmente afetam o sono e descanso noturno, os eventuais problemas de saúde que essas práticas podem acarretar e quais atitudes podem ajudar a recuperar uma boa noite de descanso.
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Hábito de utilizar o celular antes de dormir prejudica a qualidade do sono
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Por que o celular te mantém acordado?
O uso do celular antes de dormir aciona estímulos que dificultam o processo natural de adormecer. A luz emitida pelas telas, especialmente a azul, interfere na produção de melatonina (hormônio responsável pelo sono) enganando o cérebro ao indicar que ainda é dia. Além disso, o conteúdo consumido, como mensagens em aplicativos, redes sociais, notícias e e-mails, pode aumentar a ansiedade e estimular a mente, o que concorre com o relaxamento necessário para o sono.
Segundo a biomédica e diretora do Instituto do Sono, Monica Andersen, o principal mecanismo fisiológico que explica por que o celular atrapalha o sono está no relógio biológico, uma parte do cérebro chamada núcleo supraquiasmático, que regula a produção de hormônios, a temperatura corporal e o ciclo de sono e vigília. Esse sistema é muito sensível à luz, que é captada por células da retina e informa ao cérebro se é dia ou noite.
A especialista explica, que, à noite, a exposição à luz azul emitida pelas telas atrasa a produção de melatonina, hormônio que induz a sonolência, e mantém o corpo mais “quente” e desperto. Além da luz, o conteúdo consumido aumenta o estado de alerta: jogos, redes sociais e mensagens intensificam a ativação cognitiva e emocional, elevando níveis de cortisol e frequência cardíaca. “O celular estimula o cérebro e o corpo a ficarem em vigília, quando o esperado seria a desaceleração para o sono”, destaca Andersen.
Ela completa afirmando que esse efeito não se limita ao início do sono. Vibrações, notificações e o acender repentino da tela provocam microdespertares que fragmentam o descanso, fazendo com que a pessoa acorde no dia seguinte mais cansada e com menos disposição do que foi se deitar.
A radiação emitida pelos aparelhos de telefonia celular é classificada como não ionizante e traz prejuízoa para a saúde
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A luz azul é mesmo uma vilã?
Embora a luz azul tenha um papel comprovado na supressão da melatonina, ela não é a única responsável pelos impactos do celular no sono. Monica Andersen destaca que o tipo de conteúdo consumido e a forma como interagimos com os dispositivos também são determinantes. “Atividades mais emocionais e cognitivamente intensas dificultam o início e a manutenção do sono”, afirma.
Estudos recentes confirmam essa visão. Pesquisas com adolescentes mostraram que o uso interativo, como redes sociais ou jogos, prejudica o sono mais do que o uso passivo, como assistir a vídeos, mesmo sob a exposição à luz azul. A explicação, segundo Andersen, está na excitação pré-sono (pre-sleep arousal), quando o cérebro se mantém em estado de alerta, o que dificulta o relaxamento necessário para adormecer. Fatores como notificações frequentes, hábito de usar o aparelho na cama e a procrastinação ao deitar também estão fortemente ligados a pior qualidade de sono.
“A luz azul contribui para os distúrbios de sono ao alterar os sinais circadianos (ciclo biológico de 24 horas que regula funções do corpo, como sono, vigília, hormônios e temperatura, que é influenciado principalmente pela luz natural), mas o conteúdo consumido, especialmente a interação ativa com o dispositivo e o padrão de uso, parecem ter, em muitas situações, um peso igual ou até maior no impacto sobre o sono”, revela a diretora do Instituto do Sono.
Por isso, embora filtros de luz azul e modos noturnos possam ajudar, eles não são suficientes. O neurologista e psiquiatra Rogério Beato, que também é coordenador do Ambulatório do Sono do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais (HC-UFMG) reforça que o comportamento e a escolha do conteúdo consumido e a disciplina para limitar interações à noite desempenham papel crucial na qualidade do descanso.
“Tem muita gente que acorda à noite e vai para o celular. Nesse contexto, há um aspecto comportamental que está influindo na má qualidade deste sono. Então a pessoa dorme de dez e meia às duas da manhã, acorda na madrugada e vai trabalhar ou para o celular de duas até às três da manhã. Com o sono fragmentado, consequentemente, durante o dia, ela estará com irritabilidade, sonolência, falta de foco, de maneira que, com o tempo, esses pequenos problemas tomam grandes proporções”, afirma Rogério Beato.
Luz emitida pelo celular impede a indução natural ao sonoc
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Perigo além da insônia: como o celular afeta o seu corpo e mente
O uso de celular à noite vai além da simples dificuldade para dormir, com efeitos prejudiciais tanto para a saúde mental quanto física. Estudos revelam que a exposição constante à luz azul emitida pelos dispositivos pode desregular o ritmo circadiano, afetando o metabolismo, a saúde cardiovascular e até mesmo aumentando o risco de transtornos de humor. O sistema imunológico também é prejudicado pela privação de sono, já que o corpo precisa de descanso para produzir células de defesa, tornando-o mais vulnerável a doenças.
“É importante que as pessoas compreendam pra que serve o sono. Serve para repor energia, pois tem toda uma liberação hormonal, todo o funcionamento do organismo de uma maneira adequada, e tudo isso envolve não só o tempo, mas a qualidade do sono. Então, o sono tem a ver com questões físicas e de metabolismo, como ganho de peso, por exemplo. Os problemas do sono dificultam o controle do diabetes, o controle da pressão arterial, favorecem o aparecimento de arritmias cardíacas”, alerta o neurologista do HC-UFMG.
Além disso, o impacto imediato no bem-estar é evidente. A utilização do celular antes de dormir pode elevar os níveis de ansiedade e acelerar os pensamentos, dificultando a transição para o sono. Mônica Andersen ressalta que esse problema se agrava quando o celular é usado como distração para preocupações, criando um ciclo vicioso de adiamento do sono e aumento da ansiedade.
A especialista do Instituto do Sono ressalta que a vulnerabilidade ao uso do celular à noite também varia conforme a faixa etária. Adolescentes e jovens adultos são mais sensíveis à luz azul, pois o cristalino ocular permite maior passagem dessa luz. Por outro lado, adultos mais velhos e os idosos, embora menos sensíveis à luz, continuam suscetíveis ao estímulo mental das notificações, o que pode fragmentar o sono e dificultar o descanso adequado. Além disso, os sintomas comuns dessa exposição excessiva incluem fadiga ocular, visão borrada, dores de cabeça e desconfortos musculares relacionados à tensão visual, como a síndrome da visão de computador.
“Assim, embora a luz azul desempenhe um papel central nos distúrbios de sono causados pelo celular, sua magnitude e forma de manifestação variam de acordo com a idade. Então, isso reforça que as recomendações sobre uso de telas antes de dormir devem ser adaptadas para cada faixa etária para melhorar a qualidade do sono”, afirma Andersen.
No campo mental, a falta de sono está diretamente ligada a problemas como ansiedade e depressão. Dormir mal eleva os níveis de estresse e pode agravar quadros já existentes de transtornos psicológicos. Além disso, a privação do sono prejudica a capacidade de concentração, afetando a memória e o desempenho durante o dia.
“O uso de celulares pode se associar à piora da qualidade de sono e mesmo ao desenvolvimento de distúrbios do sono. Há uma correlação entre o tempo de uso do celular e distúrbios do sono, seja por questões de trabalho, estudo ou lazer. O uso excessivo de celulares cria uma situação de dependência de eletrônicos, em que os indivíduos não conseguem ficar muito tempo sem acessar os eletrônicos. E esta dependência pode se associar a sintomas ansiosos e depressivos e comprometer a qualidade do sono, reduzindo sua duração. Se este uso é noturno, ele afeta negativamente a qualidade do sono, podendo também reduzir o tempo de sono. Em alguns trabalhos, foi observada a correlação entre o uso de celulares antes de dormir e o surgimento de insônia e de sintomas depressivos”, explica Rogério Beato do HC-UFMG.
Ganho de peso, diabetes e hipertensão podem estar associados a má qualidade do sono provcada pelo uso noturno do celular
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Por que parar de usar o celular antes de dormir?
A ciência comprova que a solução para uma boa noite de sono pode ser mais simples do que parece: deixar o celular de lado. Um estudo piloto intitulado “Effect of restricting bedtime mobile phone use on sleep, arousal, mood, and working memory: A randomized pilot trial”, trouxe resultados promissores.
O estudo envolveu 38 participantes voluntários e foi dividido em dois grupos: um grupo de intervenção, que foi orientado a não usar o smartphone 30 minutos antes de dormir, e um grupo de controle, que continuou com seus hábitos normais. Os participantes usaram um monitor de atividade no pulso para medir a qualidade do sono e preencheram questionários diários.
Os resultados foram claros: o grupo que parou de usar o celular antes de dormir registrou um aumento significativo na qualidade do sono, relatou melhor humor e uma maior sensação de alerta durante o dia. Os participantes também tiveram uma melhora notável na memória de trabalho, que é a capacidade de reter e manipular informações no cérebro.
Leitura de livro antes de dormir ajuda o organismo a desacelerar e facilida o sono de qualidade
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Opinião de quem deixou de usar o celular antes de dormir
O uso do celular antes de dormir tornou-se uma rotina comum, mas poucos sabem o impacto que esse hábito pode ter na saúde, especialmente após a pandemia da Covid-19. Gisella Veríssimo, analista de Recursos Humanos, é um exemplo de como esse comportamento pode afetar o bem-estar. Após anos lidando com o sono fragmentado devido ao uso noturno do celular, seja por questões de trabalho ou distração, ela decidiu mudar seus hábitos para melhorar a qualidade de vida. “Sou inimiga do celular. Ele é veneno!!”, diz Gisella, que enfrentou crises de ansiedade, hipertensão e distúrbios gástricos, potencializados pela falta de sono regular e pelo uso constante das telas.
“Após atingir o auge da insônia, por volta de 2022, decidi procurar ajuda médica e iniciar uma terapia. Com o apoio dos profissionais, comecei a criar novos hábitos, como deixar o celular fora do quarto e limitar seu uso a emergências. A mudança foi gradual, mas com o tempo, percebi uma grande melhoria no meu sono. Hoje, deixo o celular fora do quarto e, após às nove da noite, só o uso para ligações muito urgentes. Essa mudança foi fundamental para a melhoria do meu sono e bem-estar, e já se passaram dois anos desde que recuperei a capacidade de dormir bem, sem precisar de medicamentos ou terapia”, revela Gisella. Ela destaca que, com apoio e força de vontade, é possível desconectar-se das telas e reconquistar a saúde e a qualidade de vida.
A analista de Recursos Humanos, Gisella Veríssimo, precisou passar por tratamento médico para se afastar do celular e melhorar a qualidade do sono
Reprodução/Redes Sociais
Dicas para usar o celular de forma saudável à noite
Abandonar o hábito de usar o celular antes de dormir pode ser um desafio, mas a boa notícia é que não é necessário fazer mudanças radicais. Com algumas atitudes simples, é possível melhorar a qualidade do sono e a saúde de maneira geral.
Uma das primeiras estratégias recomendadas por especialistas é estabelecer um horário limite para o uso do celular. A dica é parar de usar o dispositivo pelo menos uma hora antes de ir para a cama. Essa prática ajuda a preparar o corpo para o descanso e evita que a luz azul da tela interfira na produção de melatonina, hormônio responsável pelo sono.
Substituir o tempo de tela por atividades relaxantes também é fundamental. Em vez de navegar nas redes sociais ou assistir a vídeos, invista em alternativas que promovem o relaxamento, como a leitura de um livro físico, ouvir música calma, praticar meditação ou até tomar um chá. Essas ações contribuem para reduzir os estímulos e ajudam a criar um ambiente propício ao descanso.
“Além disso, é recomendado adotar práticas para a higiene do sono, como não ter iluminação excessiva, nem barulho e, se for necessário, usar protetores auriculares. É importante evitar ter televisão no quarto, assim como evitar o uso do computador, do celular, do tablet neste espaço. O ideal é organizar o ambiente do quarto de maneira que você se condicione a deitar e dormir”, recomenda Rogério Beato.
Outro passo importante é deixar o celular fora do alcance. Para evitar a tentação de pegar o aparelho durante a noite, é recomendado carregá-lo em outro cômodo ou longe da cama. Caso o hábito de checar o celular à noite seja difícil de abandonar, o uso de recursos do próprio smartphone pode ser útil. Ativar o “Modo Não Perturbe” ou silenciar as notificações são opções que diminuem os estímulos externos.
Além disso, ajustar o ambiente do quarto é essencial. Criar um espaço escuro, silencioso e com uma temperatura agradável é uma maneira eficaz de preparar o corpo para o sono. Estabelecer uma rotina regular de horários também ajuda a regular o ciclo de descanso e de promoção da higiene do sono.
“Criar um ritual de relaxamento sem telas ajuda a preencher o tempo antes de dormir e a facilitar a transição para o sono. Leituras em papel, alongamentos leves, respiração profunda ou meditação mindfulness têm mostrado benefícios para a redução da excitação pré-sono e melhoria da qualidade do descanso. A prática de atividades relaxantes pode reduzir pensamentos acelerados e melhorar a latência de sono, funcionando como uma alternativa saudável ao uso do celular”, orienta a diretora do Instituto do Sono.
Em resumo, fazer escolhas conscientes sobre o uso do celular à noite pode ser um pequeno, mas poderoso passo em direção a uma vida mais equilibrada e saudável. Desconectar-se, ao menos parcialmente, antes de dormir pode transformar a qualidade das noites e, consequentemente, dos dias que se seguem. Ao adotar esses pequenos hábitos, é possível não só melhorar a qualidade do sono, mas também criar uma rotina que favoreça o bem-estar mental e físico, promovendo um ciclo de descanso mais eficiente e restaurador.
Ter boas noites de sono é essencial para a qualidade de vida
Reprodução/Pexels
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